O livro narra a história de Aleksey, um miúdo agressivo filho de pai mineiro e mãe costureira, nascido na década de 50 em Krasnodar na antiga União Soviética.
A repulsa à injustiça e o espírito protetor, que impulsionavam as brigas de rua do jovem rebelde, passaram a ser canalizadas no ringue e Aleksey transformou-se não só num grande pugilista como também no símbolo do regime marxista-leninista.
O sonho do herói nacional era tornar-se o mais novo campeão olímpico de pesos médios de sempre.
O que Aleksey não sabia era que uma digressão de 6 meses pelo país, mudaria completamente o rumo da sua vida.
Nós, da Editora Europa, entrevistamos o autor para saber um pouco mais sobre as inspirações do autor para escrever o livro, assim como a mensagem que ele quis deixar aos leitores.
Confira a íntegra da entrevista com o jovem autor português João Silveiro sobre o livro Filho do Regime.
Quando e como começaste a escrever?
Comecei esta jornada, chamada “Filho do Regime”, num momento de transição na minha vida. O contexto pandémico que vivemos também foi preponderante na medida em que me trouxe mais tempo para escrever, bem como outras perspetivas.
Como escolheste o tema do livro?
O tema do livro é o culminar de um lugar e um tempo que me suscitam muito interesse (URSS, século XX). A minha proximidade e experiência no desporto, particularmente nos desportos de combate, permitiram-me um à vontade imenso na construção do quotidiano do protagonista. A criação do Aleksey está assenta numa figura bélica, combativa e perseverante, com uma personalidade sensível e introspetiva que, para além de trazer à narrativa um conflito intrapessoal, também quebra um pouco com o arquétipo do mesmo (escapando ao cliché do atleta/herói).
Quais foram as inspirações para escreveres este livro?
As minhas principais inspirações residem em autores como Jack London, George Orwell e Fiódor Dostoiévski. Muito distantes uns dos outros, eu sei, no entanto, sinto que tais diferenças me permitiram adotar um estilo híbrido e versátil. Quanto à narrativa, inspirei-me (naturalmente) em referências culturais da produção audiovisual (como o Rocky) que retratam enredos com pontos semelhantes e converti-as numa estória que, a meu ver, se enquadra mais num equilíbrio de perspetivas. Evitei centrar-me demasiado na realidade desportiva e competitiva do protagonista e optei por “dar palco” a outras questões, nomeadamente da sua contemporaneidade, dos lugares do seu tempo, das gentes do seu tempo, das questões internas com que se debatia, etc..
Sobre que temas gostas de escrever?
Gosto, essencialmente, de temas que despertem no leitor alguma reflexão sobre os mesmos. Não têm que, obrigatoriamente, levá-lo a questões existenciais, mas procuro que, no final da narrativa, existam mais questões do que respostas.
De forma mais concreta, identifico-me com personagens que fogem ao padrão e aos arquétipos típicos na construção de narrativas (apesar de ser uma missão quase utópica). Acho também que tais narrativas só têm significado quando se expõe a fragilidade e as adversidades das personagens pois, a meu ver, aproxima o leitor das mesmas e atribuem à ficção um pouco de realidade, refletindo os fenómenos do quotidiano no qual os homens são falíveis e alvo de fragilidade e vulnerabilidade.
O que gostarias de ouvir dos leitores?
Confesso que todo e qualquer feedback me é gratificante (é sinal que contactaram com a obra). Aquilo que eu espero ouvir dos leitores é que se identificaram com a estória, com as personagens e com o percurso do Aleksey. Também gosto de ouvir alguma resignação acerca de alguns desfechos pois, na minha opinião, demonstra um envolvimento emocional com a obra.
Críticas também me deixam muito satisfeito. Porque é sinal de que tenho outras perspetivas a abordar e aspetos onde posso evoluir e aprender.
Que mensagem quiseste deixar ao leitor com o livro?
Não tenho uma mensagem concreta a deixar ao leitor, até porque, como referi anteriormente, gosto que seja o mesmo a detetá-la à sua maneira e à luz do seu pensamento e da relação com a obra, porém, deixo uma: quando escrevi este livro estávamos todos em contexto de confinamento. Durante o mesmo, senti que a população se fechou mais em si mesma e o contacto com o próximo (que tem diminuído à medida que a digitalização progride) decresceu ainda mais. Ao traçar o percurso de Aleskey no papel, percebi que é o contacto com o seu povo que lhe traz clarividência e respostas para as questões que o assombravam e para as incertezas constantes.
Penso que esta pode ser uma das mensagens a transmitir.